Que mágoa é essa!
Vem, dá-me a mão, senta-te aqui comigo neste banco no alto de Santa Catarina, junto ao Adamastor, avatar dos nossos pesadelos.
Olha, com a tua alma panorâmica, o Tejo em toda a sua largura.
Se viesses lá de longe, do mar, vias Lisboa erguer-se numa bela visão de sonho, sob o azul inédito e vivo do céu, que o sol anima e fecha no esquecimento a existência misteriosa dos astros.
São sete colinas, postos de observação, massas de casas irregulares e coloridas.
Materna, campo na cidade, gentes e bichos, Lisboa tem cheiro a maresia, eterna criança do destino.
Sorri sem olhos tristes, diz devagar coisa nenhuma, não deixes os anos morrer dentro de ti, os destinos vivem-se como outra vida.
Não penses nos dias, nas horas e minutos destes anos de vida que passaram, nem nas máscaras que são anónimas, nem nas fomes insatisfeitas.
Pensa em tudo o que deste, diz obrigada.
Não peças palavras, nem baladas, nem experiências.
Deixa o desespero ou o medo, renasce a toda a hora, deixa a vida exprimir-se sem disfarces.
Vê o mar e ouve o vento que murmuram a poesia das coisas a insinuarem-se no coração.
Olha o Tejo e o espaço de partida do mar.
Lisboa é o mundo para onde se vai e volta.
Anda daí sonhar e circum-navegar.
Mas voltando sempre por aquele mar e este rio, para esta Lisboa sempre nossa.
Sabendo que a vida é breve, o tempo foge, que é preciso escolher o que não morre, o que podemos saborear como se estivéssemos na eternidade.
Vá, não chores.
Ouve o poeta:
“Alma minha, brandinha, vagabunda,
Do corpo acompanhante e moradora
A que paragens vais subir agora,
Assim tão lívida, e rígida, e tão nua?
Deixarás de gozar o que hoje gozas.”
Vem, dá-me a mão, vamos embora e sorri…